terça-feira, 12 de março de 2013

Por que um Estado Laico é importante?


A escolha do Pr. Marco Feliciano para assumir a presidência da Comissão dos Direitos Humanos na câmara reavivou um velho debate que é permeado por entendimentos equivocados sobre o Estado Laico. E quando falo de entendimentos equivocados não me refiro apenas aos que são a favor das idéias do Pr. Feliciano, mas também àqueles que são contra. O debate é extremamente polarizado, disso sabemos, mas nunca é demais falar sobre isso pela importância do tema. 

Então vamos começar pelo mais difícil. As pessoas que criticam a eleição de Feliciano por vezes não desenvolvem bem seus argumentos de maneira que soam como pessoas que são unicamente contrárias às religiões. Não duvido que exista gente assim entre esse grupo e esse fato não é incompreensível. Um desconhecimento sobre o papel das religiões na sociedade, ou a mais pura arrogância de acreditar que a fé é sinônimo de ignorância, pode desembocar efetivamente em uma repulsa às religiões. Eu prezo pelo benefício da dúvida e prefiro partir do pressuposto que essas pessoas são minoria na oposição ao nome do Feliciano na Comissão de Direitos Humanos (CDH). O que é importante destacar aqui é que defender o Estado Laico não significa lutar contra as religiões. E nesse ponto podemos partir para o segundo grupo, a saber, as pessoas que são partidárias de Feliciano e acreditam que o Estado Laico é sinônimo de uma Estado anti-religioso. Para essas pessoas eu gostaria de informar que esse não é o significado do princípio da laicidade de Estado!

Talvez o grande problema nessa discussão seja um desconhecimento da importância da laicidade do Estado em ambos os lados do debate. 

Um Estado Laico, como eu já afirmei, não significa um Estado anti-religioso, mas sim um Estado que não professa uma religião oficial. Ok, mas por quais motivos isso é importante? Vamos lá. Imaginem vocês que o Brasil fosse oficialmente um país católico hoje, como um dia já foi. Isso significaria que todas as políticas do Estado deveriam estar de acordo com a doutrina da Igreja Católica, mesmo que essa doutrina não seja aceita por algumas pessoas, como protestantes, por exemplo. Nesse caso, o sistema educacional estaria oficialmente apto a ensinar apenas o catolicismo para as crianças, imagens de santos poderiam estar espalhadas pelos prédios públicos, como um tribunal ou o congresso nacional. A Igreja Católica seria privilegiada pelas políticas públicas e apenas católicos poderiam professar sua fé livremente em cultos públicos. Nesse cenário, protestantes, umbandistas, budistas, espíritas e assim por diante seriam alijados da plena liberdade religiosa. O mesmo aconteceria se o Brasil fosse um país oficialmente batista, por exemplo, nesse caso, não só católicos teriam seus direitos desrespeitados, mas também denominações protestantes que não concordam com tudo o que os batistas acreditam, o mesmo sofreria umbandistas, espíritas, budistas e todas as outras pessoas que professassem uma religião diferente da religião oficial. 

Um Estado Laico, a saber, um Estado sem uma religião oficial, tem a obrigação de proteger todos os cidadão, independente da religião que sigam, ainda, um Estado Laico, como o brasileiro, garante na constituição que todas as pessoas têm liberdade religiosa, ou seja, podem seguir e pregar a religião que desejam. Isso justamente porque esse Estado não tem uma religião oficial e muito menos é anti-religioso, pois se fosse anti-religioso não garantiria a liberdade religiosa. Deu para entender? Não? Tudo bem! Vou dar um exemplo mais concreto.

O Irã é um Estado que tem uma religião oficial, o islamismo. Isso significa que esse Estado vai privilegiar o Islã, seus líderes religiosos muçulmanos possuem voz ativa nas decisões do Estado e pessoas que escolhem seguir outra religião são inclusive perseguidas e condenadas à morte. Difícil acreditar? Ora, vamos lembrar do pastor iraniano Youcef Nadarkhani. Nadarkhani se converteu do islamismo para o cristianismo, foi detido pelas autoridades iranianas e por ter se recusado a voltar ao islamismo foi condenado à morte. Graças à pressão e protestos internacionais Nadarkhani, felizmente, foi libertado. Mas o Irã continua a perseguir e matar cristão, por vezes pelas vias ilegais com a anuência das autoridades estatais que nada fazem para proteger pessoas com crenças diferentes da oficial. 

Youcef Nadarkhani com sua família (Fonte: Uol Notícias)


É isso que queremos no Brasil? 

Nosso país, felizmente, não sofre com guerras religiosas. Nossa nação é um lugar de liberdade religiosa onde protestantes, católicos, umbandistas, hindus, espíritas, judeus, muçulmanos, etc podem professar livremente suas religiões, podem pregar sua fé em praça pública, ou até mesmo nenhuma fé! E isso se deve especialmente ao fato de vivermos em um Estado Laico. Em poucas palavras, o Estado Laico é a única garantia para a liberdade religiosa! E todos nós, independente de nossa fé, devemos defender isso. Não vamos permitir que nossa nação vire uma praça de guerra religiosa, ou uma praça de guerra entre religiosos e pessoas sem religião. Se há algo de muito bom que temos no Brasil é a relativa harmonia entre pessoas de diferentes religiões e isso é bastante raro ao redor do mundo. Somos um bom exemplo nesse sentido, vamos honrá-lo. 

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