domingo, 14 de junho de 2015

A esquizofrenia de uma imprensa falida (O editoral da Folha de S. Paulo)



A imprensa passa por momentos críticos. Jornais e revistas lutam ferozmente para sobreviver num mercado cada vez mais competitivo graças à democratização da comunicação promovida pela internet. Hoje qualquer pessoa (eu inclusive) pode criar um blog, um website ou mesmo usar as redes sociais para produzir e distribuir conteúdo. No twitter contas como a “Lei Seca RJ” veiculam informação em tempo real não só sobre os fiscais da Lei Seca, mas também sobre o trânsito, situação do transporte público, tiroteios, etc. Uma cidadã ou um cidadão com um smartphone e acesso à internet se transformou num veículo de notícia. Nem se todos os jornalistas de uma redação passassem o tempo todo nas ruas seriam capazes de concorrer contra páginas e perfis colaborativos. Definitivamente os jornais, telejornais, emissoras de rádio e revistas perderam o monopólio da notícia. Por que comprar um jornal ou revista se podemos consultar gratuitamente informações na internet? 

Nesse cenário os veículos tradicionais de notícia precisam cada vez mais de anunciantes para continuar no mercado. E quem banca o banco controla o movimento. Obviamente que esses anunciantes querem notícias que valorizem seus produtos. Se em algum momento a imprensa tradicional teve algo de independente, esse momento acabou quando os smartphones e a internet se tornaram mais acessíveis. Agradar os donos do dinheiro virou a regra e a imprensa tradicional cada vez mais se mostra como uma mercenária capaz de encampar qualquer briga que os anunciantes queiram enfrentar. 

Aí vemos a Folha de S. Paulo dando espaço para o que há de mais reacionário no jornalismo atual. Não preciso citar nomes, uma olhadinha no elenco de colunistas mostra que, embora pouco estrelados, eles veiculam discursos agradáveis aos grandes anunciantes e mobilizadores da audiência mais conservadora de nossas terras tropicais. Ao mesmo tempo a Folha ainda cultiva um público mais progressista, uma galerinha que curte comprar jornal da banca e tem perdido a paciência com os rumos da Folha. Eu mesma cancelei a minha assinatura do jornal, definitivamente ele deixou de ser minha principal fonte de informação. Bom, mas a Folha sabe que se continuar vai perder o público mais progressista que resta. Daí elaboraram aquela propaganda da “Opinião da Folha” no qual pessoas apresentam o posicionamento do jornal e depois apresentam o próprio. Tudo para ludibriar o público, tudo para dizer que a Folha é democrática e dá espaço para o contraditório. Mas é notável  que os colunistas e o tom das notícias em geral são explicitamente do nível “reinaldete”. Quem a Folha quer enganar?

Nesse estratégia louca de tentar agradar ao mesmo tempo gregos e troianos ocasionalmente o jornal solta editoriais como esse. Ora, não foram eles mesmo que  contribuíram para alimentar o ódio insano contra um partido? Ódio que chegou a tais proporções que fomentou panelaços e manifestações de apoio explícito à ditadura? Ódio que fez “cidadãos de bem” baterem palma para o questionável Cunha só porque ele é o aliado mais oposicionista da história de um governo? Ah, Folha! Assim vocês perdem o pouco respeito que vos resta. 


Leia mais sobre a Declínio e Queda do Império da Imprensa na página da Cynara Menezes

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Uma moça (Ódio.com Parte III)

Uma moça estava voltando do trabalho. Quando cruzava por volta das 23:00 em passos velozes a rua mal iluminada em que morava na periferia de Recife foi abordada por um elemento. Ele tinha por volta de 25 anos, estava vestido com uma bermuda vermelha, camisa branca e usava um boné preto. Ele a ameaçou com uma arma, a levou para um canto ainda mais escuro e a violou. Nos jornais a notícia apareceu em destaque, nos comentários Saulo acusou: “Quem mandou ela andar a essa hora sozinha?”
Naquela mesma noite Flávio atravessou aquela mesma rua, ninguém o estuprou. 



Uma moça foi para uma festa da faculdade. Ela encontrou vários amigos. Riu, dançou, tomou umas cervejas. Se encostou num canto tranquilo da festa, cansada, meio bêbada. Um jovem a tocou nas partes íntimas. Ela no dia seguinte fez uma denúncia na Universidade, a notícia parou no jornal do campus. Na página do Face da Universidade, Paulo comentou: “Quem mandou encher a cara?”
Naquela mesma festa Caio bebeu até cair, ninguém o tocou.



Uma moça dividia a casa com a mãe, os irmãos e o padrasto. O padrasto a violentava todas as manhãs quando a mãe estava no trabalho. Um dia uma vizinha desconfiou e denunciou. A notícia foi parar no noticiário da televisão. No Twitter, Pedro opinou: “Ela deve ter provocado ele, putinha.”
Metade das vítimas de estupro no Brasil são crianças. 89% das vítimas de estupro são do sexo feminino.



Três moças foram passear na reserva ambiental da cidade num lindo domingo ensolarado. No mato três sujeitos as abordaram. Eles as estupraram e as espancaram quase até a morte. A notícia circulou rápido pela cidade, no boteco José argumentou: “Três vagabundas de shortinho no mato, elas pediram por isso”. 
Naquele mesmo domingo Ricardo, Bruno e Felipe passearam naquele mesmo parque. As fotos do lindo passeio estão no instagram de Bruno.



Uma moça terminou com o namorado. Ele a matou. Nas redes sociais, Maria comentou: “Coitado, era um apaixonado”




  • Quem mandou?
  • Ela pediu!
  • Vagabunda!
  • Putinha.

É para elas. É para mim. É para você! Qualquer mulher é culpada no incrível mundo que odeia as mulheres. 

Não compactue! Seja solidária com outras mulheres, crie uma rede de proteção entre as mulheres. Denuncie os crimes: de sangue e de opinião.